"Nos últimos dois dias, a morte começou a dar sinal de vida aqui no golfo do México. O primeiro sintoma foram 35 cadáveres de tartarugas encontrados em praias em toda parte, em lugares tão distantes quanto o Texas. Autoridades não encontraram sinais de óleo nos animais, mas nada foi dito sobre os dispersantes que estão sendo lançados pela BP pra tornar o vazamento menos evidente.
Esta manhã, conforme a maré baixava, centenas de peixes mortos foram vistos nas praias de Dauphin Island, uma linda região turística na costa do Alabama. É só o começo. Toda aquela mancha negra nojenta está lá embaixo, matando a vida sub-aquática. E o que causa mais indignação é que o poço ainda despeja 800 mil litros de óleo por dia nas profundezas do oceano.
Acho que a maioria das pessoas ainda não se deu conta da dimensão da tragédia que está se desenvolvendo aqui. Uma boa parte dos jornalistas, sobretudo os fotógrafos, começam a ficar entediados diante da falta de imagens de praias ou pássaros cobertos de óleo. Estão literalmente esperando a morte chegar. Isto porque o vazamento é profundo e a maior parte dos 20 milhões de litros de óleo ainda está lá embaixo, à espreita. Ele pode tanto aparecer e revelar todo o seu impacto destrutivo, ou ficar lá, arrasando a fauna submarina do Golfo e intoxicando a cadeia alimentar por décadas e décadas.
Se realmente vier à tona, talvez a maioria das pessoas finalmente comece a entender porque uma economia dependente de petróleo pode ser tão ruim à saúde do planeta. Além de provocar aquecimento global, gera efeitos colaterais absolutamente indesejados. Porém, se o óleo permanecer submerso, talvez não chegue realmente a indignar o planeta na proporção que o desastre requer. Espero estar equivocado.
Campanha contra exploração
Extrair petróleo em plataformas no meio do oceano é um risco desnecessário, já que a energia gerada por essa atividade pode ser facilmente substituída por fontes renováveis. É por isso que aqui, nos Estados Unidos, o Greenpeace começou uma campanha contra a extração de petróleo em alto mar, enquanto a Louisiana ainda se encontra em estado de choque.
O desastre no Golfo também serve de alerta para o Brasil, que pretende começar a bombear o óleo que está abaixo de uma imensa camada de sal, na bahia de Santos, algo nunca tentado antes. Agora imaginem uma imensa mancha de óleo se viajando pela nossa costa, destruindo todas as nossas praias: ilha do Mel, Maresias, Guarujá, Ubatuba, Parati, Angra. É isso que o povo daqui está sentindo agora. Vale a pena corrermos esse risco?
Crise comum
Na Califórnia, uma equipe de profissionais ligados à internet desenvolveu um banco de dados na web, disponibilizando informações sobre as consequências do acidente em tempo real. Qualquer um pode baixar os aplicativos que eles estão desenvolvendo para iphones e outros celulares e cooperar fazendo o upload de fotos, vídeos e textos relacionados ao acidente, contendo coordenadas geográficas de onde foram registrados.
A plataforma é gratuita, de código aberto e pode ser utilizada por todas as organizações que estão trabalhando aqui. Dessa forma, será possível acompanhar o progresso da mancha de óleo, suas consequências sobre o ambiente e as pessoas, coordenar ações com voluntários, etc... Serve alerta para que isso aqui nunca aconteça novamente.
À portas fechadas, nada se fala de tóxicos
Ontem o Greenpeace e outras organizações presentes na região tiveram uma reunião com Lisa Jackson, chefe da Agência de Proteção Ambiental (do inglês, Environmental Protection Agency - EPA). Na reunião, fechada para a imprensa, foram dicutidos aspectos como o uso de dispersantes pela BP, a falta de equipamentos de segurança para as pessoas que estão trabalhando para a empresa e a demora na disponibilização de informações por parte da agência de condições climáticas, o National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA). A EPA faz parte do esforço federal de resposta à emergência aqui no Golfo. Eles estão coletando amostras de águas da superfície e das profundezas do oceano para avaliar a extensão dos estragos.
Curiosamente, não estão medindo a poluição causada pelos dispersantes, lançados pela BP. Desde que cheguei aqui, tenho ouvido diversos relatos de gente que tem sentido o cheiro do veneno. É um problema sério, já que centenas de voluntários e trabalhadores estão sendo expostos aos produtos tóxicos diariamente, enquanto permanecem aqui.
O site do governo americano está sempre atualizado com a mais recente informação oficial sobre o vazamento no Golfo e contém, por exemplo, informações sobre as análises conduzidas pela EPA".